A temporada de resultados do segundo trimestre de 2025 das companhias listadas na B3 começou. O período costuma atrair a atenção dos investidores mais experientes, que analisam os dados financeiros para avaliar a saúde das empresas e tomar decisões de investimento. Para os iniciantes, porém, navegar por balanços e demonstrativos pode parecer uma missão impossível – repleta de siglas e números pouco familiares.
Para ajudar quem está começando, o InfoMoney preparou um passo a passo de como analisar os resultados das empresas. A reportagem contou com a orientação da professora Andréia Ribeiro da Luz, doutora em Administração e professora da Escola de Negócios da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Também foram utilizados dados da plataforma Economatica.
Onde encontrar os resultados das empresas?
Todas as companhias de capital aberto são obrigadas a divulgar seus balanços trimestrais em seus sites, na seção de relações com investidores (RI). Para facilitar a busca, basta digitar no Google expressões como “Resultados da Vale”, “Balanço da Petrobras” ou de outra empresa. Os documentos mais relevantes para análise são o Balanço Patrimonial e a Demonstração do Resultado do Exercício (DRE). Para este texto, foram considerados os documentos da Vale (VALE3) entre 2017 e 2024.
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O que analisar nos balanços?
De forma geral, a análise dos resultados financeiros se apoia em quatro grandes pilares:
- Liquidez: a capacidade da empresa de pagar suas dívidas;
- Rentabilidade: o quanto a empresa consegue lucrar em relação ao que investe;
- Endividamento: quanto a companhia depende de capital de terceiros, como empréstimos ou fornecedores.
- Lucro: o quanto o investidor consegue de lucro ao investir na empresa.
Além disso, é fundamental acompanhar a evolução da empresa ao longo do tempo, bem como comparar seus indicadores com os de concorrentes diretos e com as médias setoriais, o que permite uma análise mais contextualizada e robusta.
Liquidez: a empresa consegue pagar suas contas?
As informações sobre a liquidez de uma empresa estão disponíveis no balanço patrimonial. Segundo Andréia, dois indicadores são especialmente relevantes para uma análise inicial por parte dos investidores: a liquidez corrente, que revela a capacidade da empresa de honrar seus compromissos de curto prazo, e a liquidez geral, que aponta sua capacidade de pagamento no longo prazo.
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Liquidez corrente: É calculada por meio da seguinte fórmula: Ativo circulante ÷ Passivo circulante.
O ativo circulante representa os bens e direitos que podem ser convertidos em dinheiro no curto prazo. Já o passivo circulante inclui as dívidas que vencem nesse mesmo período. No caso da Vale, essa conta gerou uma média de 1,37 entre 2017 e 2024. “Isso significa que a Vale teve uma capacidade de pagamento de curto prazo de 1,37 vezes. Para cada R$ 1,00 de dívida, ela tinha R$ 1,37 em bens e direitos. Na prática, sobra R$ 0,37. É um indicador positivo”, explicou Andréia.
Dados da Economatica mostram que a liquidez média do setor de minerais metálicos, entre 2022 e 2023, foi de 1,6.
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Liquidez geral: É calculada por meio da seguinte fórmula Ativo circulante + ativo não circulante) ÷ (Passivo circulante + passivo não circulante).
O ativo não circulante inclui bens e direitos de longo prazo, enquanto o passivo não circulante inclui dívidas com vencimento superior a um ano. No caso da Vale, a média da liquidez geral foi de 0,63 no período. Em tese, valores abaixo de 1 indicam que a empresa pode não ter fôlego para quitar dívidas no longo prazo. Mas a professora disse o seguinte: “Nem sempre isso é um problema. Às vezes é uma característica do setor. E esse ‘longo prazo’ é indefinido – pode significar 10, 20 anos ou mais. O importante é comparar com empresas semelhantes.”
De acordo com dados da Economatica, a liquidez geral média do setor foi de 0,8 em 2022 e 2023
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Gráfico feito com ajuda de IA
Rentabilidade: a empresa gera lucro?
A rentabilidade mostra o quanto a empresa gera de lucro em relação às suas receitas, ativos ou patrimônio. Segundo a professora Andréia, a análise de quatro métricas pode dar uma visão geral sobre a situação da empresa nesse quesito. Todas estão na DRE.
Margem líquida: Esse indicador financeiro representa a porcentagem de lucro líquido em relação à receita total, calculado a partir da divisão do Lucro Líquido (valor remanescente após o pagamento de todas as despesas e obrigações) pela Receita Líquida de Vendas (faturamento gerado pelas operações comerciais). Expresso em porcentagem, revela a eficiência da empresa em converter vendas em lucro. Por exemplo, uma margem líquida de 16,20% (caso da Vale em 2024) significa que, para cada R$ 1,00 vendido, R$ 0,16 retornam como lucro”, explicou a professora Andréia. A média de margem líquida de 2022 e 2023, segundo a Economatica, foi de 16,50%.
Margem Ebtida: Mede a capacidade de geração de caixa da empresa, antes de juros, impostos, depreciação e amortização. No caso da Vale, por exemplo, a média dos últimos oito anos foi de 43,64%. Isso significa que, para cada R$ 1,00 de receita líquida, a empresa gera, em média, R$ 0,43 de lucro operacional antes de juros, impostos, depreciação e amortização, o que indica custos controlados, boa gestão operacional e capacidade de gerar caixa. A média do setor em 2022 e 2023, de acordo com a Economatica, foi 31,30%.
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ROE (Retorno sobre o Patrimônio Líquido): É encontrado a partir da divisão do Lucro Líquido pelo Patrimônio Líquido (valor que sócios e acionistas possuem da empresa). Essa métrica basicamente mede o retorno ao acionista. Na Vale, por exemplo, o ROE médio entre 2017 e 2024 foi de 24,43%. Na prática, isso significa que quem investiu R$ 1, recebeu R$ 1,24 (R$ 1 + R$ 0,24 de lucro). Segundo a equipe de research da XP, “não existe um número ideal para o ROE, mas é consenso entre os investidores que a partir de 20% se tem uma rentabilidade saudável frente ao patrimônio líquido”.
ROA (Retorno sobre o Ativo Total): Encontrado a partir da divisa do Lucro Líquido pelo Ativo Total. É uma métrica que mede a eficiência da empresa em gerar lucro em relação a tudo o que ela possui (total de seus ativos). Ex: o ROE médio da Vale nos últimos 8 anos (até 2024) é 10,29% → a cada R$ 1 investido em ativos, portanto, a empresa gerou R$ 0,10 de lucro. Um ROA superior a 5% é considerado saudável.
Ano | Margem Líquida | Margem EBITDA | ROE | ROA |
---|---|---|---|---|
2017 | 18,59% | 45,16% | 14,10% | 6,36% |
2018 | 19,01% | 45,37% | 15,51% | 7,88% |
2019 | -4,48% | 28,17% | -4,32% | -1,84% |
2020 | 15,83% | 44,30% | 17,97% | 6,80% |
2021 | 45,39% | 57,51% | 70,06% | 27,66% |
2022 | 38,16% | 45,07% | 44,78% | 19,25% |
2023 | 19,11% | 44,52% | 19,48% | 8,48% |
2024 | 16,20% | 39,00% | 17,86% | 7,69% |
Média | 20,97% | 43,64% | 24,43% | 10,29% |
Endividamento geral
O endividamento geral mede a proporção dos ativos de uma empresa financiada por capital de terceiros (dívidas). Seu cálculo é feito dividindo o Passivo Total (excluindo o Patrimônio Líquido, já que o objetivo é avaliar apenas o financiamento externo) pelo Ativo Total. Esses dados estão disponíveis no balanço patrimonial. No caso da Vale, o índice médio do período analisado foi de 56,83%, indicando que mais da metade de seus recursos vem de obrigações como empréstimos e fornecedores. “É um patamar saudável, considerando que a média do setor no Brasil gira em torno de 60% a 65%’, explicou Andréia.

Gráfico feito com ajuda de IA
Lucro por Ação (LPA) básico e diluído
Por fim, vale olhar o Lucro por Ação (LPA), presente no demonstrativo de resultados. Ele indica quanto de lucro líquido a empresa gerou para cada ação em circulação em dólar. Ele é calculado dividindo o lucro líquido atribuível aos acionistas da controladora pelo número médio de ações ordinárias em circulação. Um LPA mais alto costuma ser um sinal positivo, pois indica maior geração de lucro por ação. No caso da Vale, por exemplo, a média entre 2017 e 2024 foi de US$ 1,85 por ano, o que significa que, em média, a companhia gerou esse valor de lucro líquido por ação anualmente no período analisado.
Ano | LPA |
2017 | 1,06 |
2018 | 1,32 |
2019 | -0,33 |
2020 | 0,95 |
2021 | 4,47 |
2022 | 4,05 |
2023 | 1,83 |
2024 | 1,44 |
Média | 1,85 |
Alerta
É importante lembrar que analisar os resultados passados de uma empresa ajuda a entender seu histórico, sua consistência e como ela se comporta em diferentes contextos. No entanto, isso não garante que os mesmos números se repetirão no futuro. O desempenho futuro pode ser influenciado por mudanças no mercado, na economia, na gestão ou no setor em que a empresa atua. Por isso, uma boa análise vai além dos balanços passados: considera também perspectivas futuras, estratégias da empresa, riscos envolvidos e o cenário macroeconômico